sábado, 10 de julho de 2010

Melhor de Três

Melhor de três é uma peça que conta a história de três adolescentes em cituações do cotidiano. Até que a vida lhes prega uma peça.
Sem dúvida alguma, essa peça inédita de Rodrigo Nogueira, será mais um grande sucesso do autor. Que, agora, deseja saber a sua opinião. Deixe - a como cometário.

Melhor de Três

A peça se passa num palco vazio com um telão atrás. Os cenários, passagens de tempo e alguns personagens são projetados no telão.

Júlia
17 anos. Doce e centrada. Quer fazer faculdade de veterinária e é apaixonada pelo namorado Gastão.

Gastão
18 anos. Divertido e extrovertido. Não é lá muito estudioso, mas está longe do estereótipo do fortão burro. Um garoto comum, que adora esportes e é bastante esperto. Quer fazer faculdade de educação física. Ama sua namorada Júlia.

Andrezinho (Dedé).
17 anos. Inteligente e tímido. Melhor amigo de Gastão. É completamente diferente dele, mas os dois se dão muito bem. Andrezinho também é bastante amigo de Júlia e segura a barra das brigas do casal porque gosta muito de ambos.


Cena 1

Música jovem e acelerada. Os três entram em cena fazendo mímica de ações do cotidiano dizendo os seguintes textos simultaneamente e repetidamente. Num dado momento, a música cai pra BG e cada um deles se destaca dizendo o texto sozinho:



Andrezinho: Quando eu era criança eu ficava pensando em como o Universo era enorme. Daí eu criava coragem pra fazer o que eu bem entendesse. Eu pensava que se tinha tanta coisa acontecendo no infinito, uma coisinha que eu fizesse não faria a menor diferença pro mundo. Mas agora esse mesmo pensamento que me deixava tão corajoso, tem me deixado sem ação. Agora parece que tudo o que eu faço acaba virando uma bobagem perto de tanta gente fazendo tanta coisa. Às vezes eu tenho a impressão de que eu vou ser engolido pelo universo. Sabe quando a gente olha uma tela de televisão bem de perto? Você percebe que a imagem é formada por um monte de pontinhos coloridos. E que se um desses pontinhos se apagar não vai fazer a menor diferença pra imagem toda. Às vezes eu me sinto como um desses pontinhos. Parece que se eu sumir não vai mudar muita coisa no mundo.

Gastão: Medo é uma parada que dá e passa. A gente sente e depois não sente mais. É como se a gente, sei lá, se esquecesse dos perigos que podem acontecer com a gente a qualquer momento. Mas teve um dia que eu vi um atropelamento sinistro da janela do meu quarto. Uma garota mais ou menos da minha idade atravessou a rua fora de hora e um carro bateu nela. Tava segurando uns livros. Tudo arremessado pra longe. Demorou uns dez minutos pra ambulância chegar e levaram ela. Acho que ela não morreu não. Mas nesses dez minutos ela gritava tanto, mas tanto, que me doía só de ouvir o grito dela. Ela sofreu muito. A minha vó me fala desde que eu sou criança que a única certeza que a gente tem é a morte. Eu posso ficar 50 anos sem pegar um resfriado, mas eu sei que um dia eu vou morrer. Quando eu vi aquela mulher sofrendo eu comecei a... sei lá. Medo é uma parada que dá e passa. Mas desde aquele dia eu vivo o tempo todo com medo de sofrer.

Júlia: Sabe qual é a coisa mais difícil de sair da adolescência? Ser mulher e sair da adolescência! Tudo bem. Eu ainda tenho dezessete anos. Teoricamente ainda sou adolescente. Mas já começam as cobranças pro resto da minha vida! O que eu vou fazer na faculdade, com o quê que eu vou querer trabalhar, se o meu namorado é o homem certo pra mim... É tanta coisa, tanta coisa. Porque a mulher hoje em dia ganhou o direito de trabalhar e ganhar dinheiro igual ao homem, mas não perdeu o dever de manter uma casa e ser mãe de família. Então agora eu to com dezessete anos, tendo que tomar um monte de decisões definitivas pro resto da minha vida sendo que seis anos atrás eu ainda estava brincando de Barbie! Eu acho que a gente só devia poder escolher a nossa profissão com mais de trinta. E pensar em casar com 40. Pelo menos assim a gente ia ter tempo pra conhecer mais gente e experimentar todas as possibilidades de trabalho. É mais certeza de acertar. Mas eu sei que não é bem assim, né? A vida é muito mais direta. Não direta não é bem a palavra. A palavra é...

domingo, 4 de julho de 2010

Prólogo

Abre a cena com Lisa e Patrick lado a lado, de frente para o público, sentados no chão em silêncio. um clima forte e estranho. os dois ficam um tempo olhando um pro outro como se quisessem dizer alguma coisa (mas sem fazer esforço pra demonstrar). patrick, então, escreve algo num papel, dobra e passa para lisa. lisa abre, lê e fecha. escreve algo de volta e passa para patrick. patrick repete as ações e devolve um papel para lisa. ela abre e lê, quando vai escrever de novo pra ele, quase chorando, vem michel da platéia, fumando um cigarro com um turbante na cabeça, um robe meio gay aberto. ele está pelado e com umas pérolas em volta do pescoço. anda e fala displicentemente quebrando totalmente o “clima” da cena.

Michel: Beijos roubados. (T) Beijos roubados não. Beijos proibidos, porque beijos roubados é o título original em francês “baiser volées”. Ah, e como o filme foi chamado em Portugal também.

lisa quebra também e fala em clima de competição. todo esse diálogo deve ser muito fluente, como se fossem os atores falando entre si.

Lisa: Falou beijos roubados primeiro. Falou primeiro.

Patrick: É verdade, falou primeiro.

Michel: Eu corrigi logo em seguida.

Lisa: Não interessa, vai ter que pagar.

Michel: (segura no pau) Paga aqui, ó...

Lisa: Grosso.

Patrick: Você não era assim.

Lisa: É verdade. Não era.

Os dois se aproximam.

Michel: Beijos proibidos, François Truffaut, 1968. Terceiro filme do Truffaut com o personagem Antoine Doinel como protagonista. Antoine, que era um alter-ego do Truffaut, apareceu pela primeira vez nos “Incompreendidos” como criança e depois no curta “Antoine e Colette”. Beijos probibidos é uma espécie de continuação desse curta.

Patrick: Continuação desse curta?

Michel: Continuação desse curta.

Lisa: Continuação, prólogo ou epílogo, peu m’importe: errou o título e vai ter que pagar.

Michel: Já te falei, paga aqui.

lisa se levanta veemente.

Lisa: Então tá.

silêncio. michel fica sem jeito

Lisa: Eu pago. (T) Me ajuda, Téo?

Michel: Téo???

Patrick (fala para lisa, calmo): Se você quiser. Você quer, Mateus? (olha para ele).

Michel: Eu quero? Eu quero o quê? O quê que eu quero?

Os dois começam a andar em direção a michel que fica extremamente acuado e nervoso. começa a falar do nada.

Michel: Nos “incompreendidos” o Antoine Doinel era uma criança que sofria muito e mentiu na escola dizendo que a mãe morreu pra justificar porque ele faltava tanto.

lisa e patrick continuam andando.

Michel: No curta “Antoine e Colette” o Antoine Doinel aparece mais jovenzinho que começa a ter um relacionamento amoroso com uma moça.

Patrick: Com uma moça? Olha! Que interessante.

e voltam a acuar Michel.

Michel: Já o Beijos Roubados é um filme totalmente diferente. Totalmente diferente porque é leve, engraçado, que tem aquela música “Que reste-t-il” do Charles Trenet e não tem muita história. O Truffaut fica só seguindo a vida do Antoine sem dar muita importância pros acontecimentos. Muita gente critica esse filme dizendo que tem que acontecer alguma coisa. É filme! Não pode ser só uma história simples de cotidiano e vida...

Lisa: É. Não pode, né? Tem que acontecer alguma coisa.

Patrick: Tem que acontecer alguma cosia.

Lisa: Se não acontece nada, qual é a graça?

os três fazem um longo silêncio. e não acontece nada. patrick e lisa que estavam, até então, acuando Michel param e Michel também para de “fugir” deles. depois de algum tempo de nada, lisa irrompe.

Lisa: Vai pagaaaaaaar!

lisa e patrick, como loucos, saem gritando atrás de michel que foge deles, meio pelado. os três somem de cena. entra “que reste-t-il” de Charles Trenet. no telão surge a seguinte sequência de imagens:

1) Filme “beijos proibidos”, os dois trocam bilhetes, como na primeira cena

2) Filme “beijos proibidos”, cena divertida de Antoine

3) Filme “beijos probidos”, um dos primeiros takes, porta da cinemateca fechada

4) imagens de arquivo, porta da cinemateca fehcada “de verdade”

5) imagens de arquivo, violência na frança em maio de 68

6) imagens de arquivo, violência no Brasil em maio de 68

tudo ao som de “que reste-t-il”. as imagens vão ficando violentas mas a música faz um contraponto. a música sempre volta a partir de um certo ponto.

CENA 1

Agora tem que ver a peça!!!

Em homenagem a estreia de "Os Inocentes" de Rodrigo Nogueira e Julia Spadaccini uma reportagem de fevereiro desse ano sobre a peça

21/02/2010 Livro sobre maio de 1968 ganha versão na peça 'Os Inocentes'

por Jornal do Brasil O turbulento maio de 1968 vem norteando artistas mundo afora. Foi evocado por Mauro Rasi em A cerimônia do adeus, a melhor de suas peças de fundo autobiográfico, registro do rito de passagem de um jovem dividido entre o cotidiano numa cidade do interior paulista e a paixão por Simone de Beauvoir. Ganhou lugar de destaque nas pautas de cineastas como Louis Malle, no ótimo e pouco lembrado Loucuras de uma primavera (1989), e Hans Weingartner, em Edukators (2004), flagrante da intensidade das relações em décadas passadas. A célebre data reverberou ainda em Gilbert Adair, autor do livro The holy innocents que inspirou Bernardo Bertolucci na concepção do filme Os sonhadores (2003), roteirizado pelo próprio Adair. Livro e filme vão desembocam no palco. Trata-se de Os inocentes, texto de Rodrigo Nogueira e Julia Spadaccini, que tem estreia marcada na sala Multiuso do Espaço Sesc, em Copacabana, para 2 de julho.

esquerda: Patrick Sampaio; meio: Lisa Fávero; direita: Michel Blois



Na história de Adair, dois irmãos gêmeos e um amigo (que na peça vão se chamar , respectivamente, Teodoro, Isabela e Mateus) se trancam dentro de um apartamento enquanto Paris explode do lado de fora.
Triângulo amoroso

– Acho que a circunstância dos três fechados num apartamento não deve ser vista como escapismo em relação ao conturbado contexto externo, mas como um mergulho profundo de cada um. Eles quebram dogmas pessoais, espreitam a morte e se fortalecem para encarar a vida – observa César Augusto, integrante da Cia. dos Atores, convidado pelos três (Patrick Sampaio, Lisa Fávero e Michel Blois) para dirigir a montagem.
Em Os inocentes, o espectador acompanhará a evolução do triângulo amoroso entre personagens que perdem a inocência ao tangenciarem os próprios limites numa época de ruptura de padrões comportamentais.

– No livro Adair diz: “Há os que têm coragem para se matar e os que não têm. Os que não têm são os que se matam. No fundo somos todos suicidas” – relata Michel, que interpretará Mateus.
De acordo com Rodrigo Nogueira, Mateus representa o estrangeiro que mostra a Teodoro e Isabela que eles vivem como amantes e não como irmãos.


– Não há julgamento moral no livro; apenas a percepção de que este comportamento gera consequências – sublinha Rodrigo.

O processo de Os inocentes lembra o de outro trabalho recente de Rodrigo, o de construção da dramaturgia de Play, oriunda de Sexo, mentiras e videotape (1989), cultuado filme de Steven Soderbergh. Tanto num projeto como no outro, o parentesco com o cinema ocupa lugar de destaque.

– Quero propor a intervenção do vídeo no espetáculo, de modo que, no final, a realidade passe para a tela e o imaginário fique no palco – diz Rodrigo, sublinhando a suspensão da fronteira entre real e ficção, uma das principais características da sua dramaturgia. – No momento-chave do texto, em que uma pedra entra pela janela do apartamento, a realidade invade a ficção.

A distância entre atores e personagens também será questionada através de jogos cênicos propostos por César Augusto.

– Peço para os atores misturarem histórias pessoais com as dos personagens – assinala César. – Os jogos ajudam a criar uma gramática comum e a fazer com que os atores acionem a criatividade e se afastem da instância cerebral.

A encenação trará referências aos protestos de maio de 1968, desprendendo-se possivelmente de menções diretas, como o polêmico afastamento do pesquisador Henri Langlois da Cinemateca Francesa.
– Queremos mostrar que o mundo se fechou naquele momento, não só os três personagens ou a cidade de Paris. Tudo ficou mais claustrofóbico – complementa César.

Contexto brasileiro

Ainda assim, conexões com o contexto brasileiro são não só quase inevitáveis como desejadas.


– Espero que não fiquemos presos a um passado de referências. Mas o passado nos foi negado. No Brasil muita gente não admite que houve um golpe de estado. Existem lacunas que precisam ser preenchidas – aponta César, evocando o período que marcou o acirramento da ditadura no Brasil com a implantação do AI-5.

Gilbert Adair se mostrou aberto às propostas de apropriação de seu livro.

– Lisa entrou em contato com ele, que liberou os direitos de graça. Ficamos livres para fazer a adaptação. Adair pediu apenas para ver o espetáculo, sem custo de passagem incluído – comemora Patrick Sampaio, integrante, ao lado de Lisa Fávero, do Brecha Coletivo, proponente de Os inocentes.
Na verdade, a ideia de transportar The holy innocents para o palco partiu de Lisa e foi apadrinhada por seu tio, o ator Fernando Eiras, que figura como supervisor do projeto. A iniciativa ganhou força com a conquista da verba de R$ 50 mil do Prêmio Myriam Muniz.


– O Brecha funciona como um coletivo aberto. Não existem pessoas fixas. Elas se aproximam de acordo com cada projeto. Há atores, cantores, músicos, cineastas, fotógrafos. Investimos em várias frentes: vídeos, performances, dança – detalha Lisa.

Uma filosofia próxima da Pequena Orquestra, coletivo do qual Michel Blois, Rodrigo Nogueira e Fernanda Felix (assistente de direção) fazem parte, e da própria Cia. dos Atores, apesar de o grupo capitaneado por Enrique Diaz ser formado pelos mesmos oito integrantes presentes desde a fundação.

– Somos pessoas completamente diferentes umas das outras há 21 anos. Por isto, cada um é livre para aderir ou não a novos prejetos. O processo de individualização dentro do coletivo é revolucionário – garante César.