Rio de Janeiro, ano de 2098. A cena se passa no período depois da guerra entre os traficantes de morros e o poder público.
Dois homens numa mesa numa calçada. Duas taças de vinho e algumas garrafas. Eles conversam.
1: O chileno é muito bom.
2: É suave né?
1: Muito.
2: Não deixa muito resquício.
1: Resquício?
2: Quer dizer, resíduo.
1: É por isso que é suave.
2: Exatamente.
1: E é exceção entre os sul-americanos.
2: Ah, sem dúvida, sem dúvida alguma.
1: O brasileiro, por exemplo, tende a ser sempre bem encorpado, forte.
2: É. Mas em compensação não é tão rascante quanto o argentino.
1: Ah, não. O argentino é o mais.
2: Poxa é uma pena a gente não ter nenhum Europeu hoje. (cheira uma carreira de cocaína).
1: Esse é qual?
2: Boliviano.
1: Hmmmm. Acho que vou dar um tempo. Boliviano me sobe à cabeça muito rápido. Mas sem
dúvida é o melhor em sabor.
2: Você acha? Prefiro o venezuelano.
1: Não… O pó venezuelano é muito fraco.
2: Mas em compensação tem sabor.
1: É, mas o boliviano pra mim reúne todas as qualidades dos sul-americanos. Ele é encorpado como o brasileiro, rascante como o argentino e não deixa resíduos como o chileno…
2: É verdade.
1: E tem sabor.
2: Acho que você tem razão, sabia?
1: To dizendo.
2: Experimenta esse da Califórnia.
1: Da Califórnia não.
2: Ah, pelo amor de Deus. Você não é daqueles que tem preconceito com cocaína da Califórnia, né? Por favor.
1: (cheira) Nada demais.
2: Preconceito.
1: Da próxima vez a gente tem que comprar um Europeu. Não precisa nem ser francês, mas um italiano já levanta o nível, né?
2: Ta certo. Ih rapaz, olha a polícia!
1: Ai meu Deus. Esconde, esconde, esconde!
(Eles escondem as garrafas de vinho)
2: Tudo bem seu guarda.
Guarda: Oba.
2: Vai um tequinho, aí?
Guarda: Não, obrigado. To de serviço, meus amigos.
( um deles esbarra na garrafa)
Guarda: Que barulho foi esse?
2: Não sei não, seu guarda.
Guarda: Vocês por acaso não estão consumindo nenhuma droga ilícita, não né?
2: Claro que não seu guarda. Estamos só dando nosso tequinho aqui.
1: Por favor, seu guarda. Nós somos apreciadores profissionais de pó. Não vamos estragar nossa degustação com nenhum entorpecente que vá interferir nos sabores e efeitos da cocaína.
2: Exatamente.
Guarda: Olha aqui, eu não quero problema não hein. Seu eu souber que vocês estão consumindo qualquer tipo de bebida alcoólica, uma cervejinha que seja, vai todo mundo em cana.
1: Por favor.
(guarda sai)
1: Que absurdo.
2: Será que um dia a gente vai poder tomar um vinhozinho em paz?
1: Difícil, meu amigo. Difícil.
Nenhum comentário:
Postar um comentário